4 de novembro de 2007

Professores de mãos dadas com o meio ambiente


O tema transversal Meio Ambiente deve ser trabalhado de forma implícita nas questões diárias de cada disciplina escolar. A orientação é de Tania Regina Moura Bueno, assessora pedagógica da OAK Educação e Meio Ambiente, empresa que desenvolve produtos e projetos na área das ciências da vida com o objetivo de levar o conhecimento produzido na universidade para o ensino básico. Ela entende que é preciso capacitar o aluno como cidadão que se veja como um ser histórico. “Precisamos entender o meio ambiente como resultado de todas as ações humanas”, salientou.
Nesta entrevista, a pedagoga, especializada em orientação educacional e coordenação pedagógica, esclarece algumas dúvidas de professores sobre a importância da interdisciplinaridade na educação ambiental. Sobre os livros didáticos, critica sua fragmentação, embora reconheça avanços na qualidade do conteúdo. Leia também sobre a sua orientação quando o jornal for utilizado na sala de aula.

O meio ambiente é um tema transversal. Considera correta a orientação dada neste documento?
Tania Regina Moura Bueno — Isso é um contra-senso do MEC (Ministério da Educação). O tema transversal colocado nos Parâmetros Curriculares veio a reboque da Agenda 21, documento que o Brasil assinou em 1992 e que traz uma questão relacionada à educação ambiental formal. Então, o MEC transformou esse tema (do meio ambiente) como transversal, o que não exigiria alguém especializado dando aulas de uma disciplina chamada meio ambiente. Essa foi uma saída do governo brasileiro.
De qualquer maneira, foi sendo desenvolvido nas escolas muito precariamente porque a partir de um tema transversal tem-se ou não obrigatoriedade de usá-lo. Na verdade, todos os Parâmetros são apenas parâmetros. Então o tema ficou à mercê de objetivos dos projetos pedagógicos de cada escola. No ano passado, foi sancionada uma lei que obriga as escolas a trabalharem com a educação ambiental, mas ainda não foi regulamentada. São ações que vêm da Agenda 21 e de um movimento da globalização. O Brasil está tomando algumas ações para fazer jus à sua assinatura naquele documento e, às vezes, o professor não se percebe enquanto agente desse movimento maior.
Então, na sua opinião, o professor deve adotar esse tema transversal?
Tania Regina Moura Bueno — Os temas transversais são muito abrangentes. Há o de ética, de saúde, de pluralidade cultural... E o professor não sabe muito bem o que fazer e como fazer. O que eu penso é que temos, antes de tudo, que trabalhar com o meio ambiente de forma implícita, nas questões diárias. O meio ambiente é um aspecto que precisa ser enfocado pelo professor enquanto cidadão. Tenho encontrado nos cursos de capacitação muitos professores que não leram o tema transversal Meio Ambiente. Claro que é por falta de tempo e também porque há de se ter um movimento de estudo promovido pela escola, mas o importante é que ele comece a estudar o assunto, nem que seja lendo esse texto do tema transversal. Lendo, certamente vai rememorar vários momentos em que poderia ter abordado o meio ambiente em suas aulas. Além disso, é também importante o educador conhecer a Agenda 21 e outros documentos decorrentes dela.
Para o professor é difícil compreender como funciona a interdisciplinaridade. Considerando isso, fora o professor de ciências e de biologia, como os outros professores poderiam abordar o meio ambiente em sala de aula?
Tania Regina Moura Bueno — O meio ambiente é um aspecto que foi trazido de fora para dentro da escola. Mas, se a gente se percebe enquanto cidadão, este é um tema que permeia nossa vida assim como outras questões que se colocam em português, em matemática, em física. Por exemplo, vim correndo hoje para casa por causa da "enorme" chuva que estava prestes a cair em São Paulo. A “questão ambiental bate na porta do cidadão”, que pode ser o professor, o médico, o arquiteto...
Até uns dez anos atrás nossos livros didáticos não incluíam o ambiente como conteúdo importante. Atualmente, já é possível o professor de geografia falar de relevo e também das questões antrópicas e ambientais que estão envolvidas. A OAK trabalha com um projeto transdisciplinar chamado Roda d’Água, para todos os professores — português, matemática, história geografia... de pré-escola ao ensino médio. Nele promovemos ações para que o professor trabalhe questões que capacitem o aluno como cidadão e entenda que nós somos homens históricos. Usamos a bacia hidrográfica como tema central e o professor interessado pode abordar diversos aspectos do tema em suas aulas: o de artes vai trabalhar o folclore dos rios; o de português pode trazer os textos históricos relacionados; o de história pode abordar a erosão que houve com os bandeirantes que assorearam os rios... Precisamos entender o meio ambiente como resultado de todas as ações humanas. Quem nadou no rio Tietê? Vamos trazer essas pessoas para fazer uma entrevista na escola, porque é muito difícil uma criança ou um adolescente imaginar a possibilidade de se ter um rio limpo já que quando nasceram, ele já estava poluído. E assim com todas as outras questões do meio ambiente, como o clima, o lixo etc.
Os livros didáticos estão mais adaptados a essa nova consciência sobre o planeta? Tem alguma crítica?
Tania Regina Moura Bueno — Acho que houve um grande avanço desde a Agenda 21. O MEC, com a avaliação que faz anualmente, qualificou melhor os livros didáticos. Também classificou alguns temas, como o de meio ambiente, como importantes, e que precisam estar contemplados em seus conteúdos. Então, nesse aspecto houve avanços. A minha crítica é que o livro didático está sempre fragmentado. O meio ambiente não pode mais ser visto se não for de uma maneira interdisciplinar ou até transdisciplinar. Não se pode abordar o meio ambiente se não falarmos de ética, de cidadania, de valores, de qualidade de vida...
Seria uma herança positivista?
Tania Regina Moura Bueno — Exatamente. Fica mais ou menos assim: “eu vou trabalhar com história dos Bandeirantes porque estou dando aula de história”, de forma pontual. Se esse professor não abordar também como os rios foram assoreados, e porquê, não há como o aluno entender a implicação que há entre aquela ação histórica com a realidade atual. A sujeira de nosso rio suja o rio da cidade vizinha assim como nossas ações atuais vão determinar a realidade das gerações futuras. Então, é muito interdisciplinar a questão para se trabalhar tão segmentadamente. Esse, considero, é o maior problema do livro didático. Gosto muito de uma frase da Emilia Ferrero. Ela diz que “o bom livro didático são os bons livros de literatura, as boas enciclopédias, os bons dicionários...”
Conhece o conceito de ecopedagogia? O que acha dessa proposta diante das orientações oficiais?
Tania Regina Moura Bueno — Nós usamos o termo ecossistêmica. Na verdade, este é o título de um livro (Ecossistêmica - Uma abordagem integrada dos problemas do meio ambiente, Editora Edgard Blucher) do professor Samuel Murgel Branco, da Universidade de São Paulo, que mostra que o importante é a qualidade de vida do homem conseguida levando-se em conta também os outros seres vivos, e toda a biodiversidade do planeta. Mas não é só integrar o ser humano e sim colocá-lo como íntegro no meio ambiente. Não se pode falar “vamos limpar o meio ambiente” e conviver com políticas amorais ou sem ética. É um conjunto de relações que não só limpam as praças ou despoluem o ar, mas também educam as pessoas para a qualidade da vida e das relações.
Que tipo de preocupação o professor deve ter para utilizar o jornal como instrumento pedagógico na sala de aula?
Tania Regina Moura Bueno — Se o professor não leva o jornal para a sala de aula, o aluno leva a questão do acontecimento emergente. O professor deve ouvir primeiro o que os alunos querem saber, procurar investigar o que eles já sabem sobre o assunto, e assim planejar de que ponto começar. Lembro de crianças pequenas, da primeira série, querendo saber como é um vulcão, um furacão, o El Niño... Foram questões que nasceram com os alunos, que viram pela tevê ou em revistas, mas que eles não entenderam satisfatoriamente. Então, qualquer professor, de qualquer disciplina, pode abordar a questão do meio ambiente usando perfeitamente o jornal. Acho até que é o melhor veículo para se começar a trabalhar com tema.
E que tipo de restrição ou precaução recomendaria ao professor?
Tania Regina Moura Bueno — Na imprensa, sempre aparece aquilo que é notícia. Depois, não encontramos o encaminhamento daquela situação. Então, recomendo não deixar que o assunto fique outra vez fragmentado. Pode-se ficar acompanhando o fato por meio de sites especializados, ou ainda retornar essas questões para o jornal. Se o jornal pára de falar sobre um determinado assunto, o professor deve incentivar os alunos a fazerem esse questionamento de volta ao jornal, até porque o repórter precisa desse retorno para conhecer melhor o interesse desse público jovem.

Fonte:http://www.educabrasil.com.br

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